quarta-feira, setembro 27, 2006

Cosme e Damião...... Ahhh que saudade que tenho da aurora da minha vida, da minha infância perdida que os velhos tempos já não trazem mais.

Já eram 12h30min a fome batia forte sem nem mesmo tocar a campanhia, então resolvemos almoçar. Após enganar o estômago rolaram umas voltinhas na casa de Rui Barbosa e quando estou saindo para voltar pro trampo, eis que me deparo com aquele imenso logotipo das Lojas Amercianas do outro lado da rua. Curioso que sou, adentrei pela São Clemente e já fui logo invadindo aquele novo universo, parecia que havia ganho um ticket para outra dimensão e chegando lá me deparei com algo mais surreal ainda... parecia um Rei sentado com toda sua maestria em seu trono ( é trono e não troninho, como apenas um diminutivo pode mudar consistentemente o significado de uma palavra, né?), ou um troféu ganho pelo melhor dos melhores gladiadores da Roma Antiga na pior de suas batalhas contra Leões esboçando ódio em seu olhar e donos de dentes afiadíssimos, verdadeiras garras. Mas estava lá, sem nem mesmo esboçar um gesto ou qualquer movimento e fui me aproximando, me aproximando cada vez mais e fui pego de surpresa sem nem mesmo dar tempo para o meu cérebro raciocinar:
- Puta que pariuuuuuuuuuuuuuuuuuuu, um saco gigante de pipoca rosa por apenas 2,99! Caralhooooooooooooooooo
Nem preciso dizer que sai com o meu troféu, andava na rua com o peito estufado, olhar certeiro esboçando para todos a minha mais nova aquisição do dia, e ainda de quebra rolou um saco de chicletes ácidos para tentar pregar algumas peças em alguém do trabalho. Parecia um lorde inglês andando pelas ruas “minadas” de Botafogo com seu brinquedinho novo na mão.
Ao chegar ao trabalho coloquei o motivo de tanto orgulho para minha pessoa no centro da minha baia, encima de umas revistas de petróleo que recebo todo mês, nem sei por quê. Não demorou cinco minutinhos e as pessoas já começavam a gritar de felicidade, quando escuto uma voz lá no fundinho dizendo: Olha o que o Thiago comprou de Cosme e Damião pra gente...
Pronto, tomei um baque. Tiro certeiro. Como assim Cosme e Damião? Cadê as crianças pedindo doces ou roubando os da macumba?
E não demorou muito, passou um vídeo inteiro da minha “velha infância” num destes bairros que os cariocas chamam de subúrbio.
É, para quem não sabe, sou fruto de uma classe média suburbana. Recordo com afeição da minha infância em tais locais, toda a minha trajetória, minhas raízes e até um pouco da minha identidade foram formados ali com tanto afinco. Um dia quem sabe, posso estar com bastante dinheiro ou até morar em uma cobertura na Vieira Souto, mas se por acaso, isso acontecer a minha essência continuará a mesma, minhas raízes estão plantadas eternamente no subúrbio, e não tem reforma agrária que as tire de lá. Vocês entrarão na “minha cobertura” mas ao abrirem a geladeira só depararão com coxinhas, risole, quibe, joelhos e por aí vai. Não existe ex-viado, ex-mulher... então parando para pensar sob esta lógica também não existe ex-suburbano.
Voltando à minha infância, sempre fui um garotinho muito medroso, mas isso não impedia que fosse um capeta... Deus me livre!
Apesar de ser aquele garotinho gordinho que sempre sonhou em ter uma piscina cheia de Coca-Cola dentro de casa , que sempre nas aulas de educação física era um dos últimos a ser escolhido no par ou ímpar e ainda ia pro gol, que sempre respondia as perguntas totalmente pertinentes com frases totalmente impertinentes, como:

- Você quer carona?
-Não obrigado, eu já almocei hoje.

Ou

- E aí já vai dormir?
- Pois é , não tenho dinheiro o suficiente, mas estou juntando no porquinho.

Confesso que até os dias de hoje sou fãs de frases desconexas em situações completamente conexas, mas deixa isso pra lá, são resquícios de uma infância suburbana hiperativa e com um primário bem feito. Pois o primário é a base de todos os nossos alicerces, de toda a nossa estrutura emocional e racional e quando este é mal feito, fudeuuuu. Não adianta, é batata. Pode ser o presidente do país, CEO de Multinacionais, artista, intelectual... mas se tem um primário mal feito, fudeu.
Como era gostoso o dia de São Cosme e Damião, corria o bairro todo pedindo doces para quem cruzasse o meu caminho. Era tão legal passar pelas ruas e me deparar com aquelas senhoras sentadas com as suas cadeirinhas de praia na frente das suas casas para tricotar com as “meninas”. Detalhe as meninas aqui referidas são também senhoras com seus 80 e poucos anos de praia. Eu passava por elas e sempre me perguntava internamente: De que museus saíram essas múmias? Mas no fundo, no fundo eram nada mais que “doces meninas” o velho era eu mesmo.
Como era gordinho, andava menos, logo pegava menos doces, logo.... era o mais o zuado entre os amigo, certo? Erradooooo, eu roubava todos os doces da macumba que tinha a cada três postes percorridos. Mal sabiam os moradores do meu bairro que naquela época, em dia de São Cosme e Damião, metade do subúrbio era abastecido com doces de macumba que eu roubava e falava que havia ganho, para não ser o mais zuado da turma.
Recordo também daquele céu azul cheio de pipas mergulhando nas nuvens como se fossem verdadeiros espermatozóides na corrida ao óvulo. Alguém aí, se lembra de algum dia ter visto uma pipa nos céu desta terrível e cosmopolita Metróple em que as crianças não vão para as ruas pegar doces no dia de Cosme e Damião?
Não né? Porque tem coisas que só os subúrbios fazem pra gente, depois em outras oportunidades lhes conto melhor sobre os clóvis ou vulgos bate-bolas, porque provavelmente vocês estavam jogando Alex Kid no Máster System e não vivenciaram estas dádivas dos céus.
O mais engraçado foi relembrar aqueles tiozões que sempre estavam soltando pipas junto dos moleques do bairro e depois quando tinham seu objeto de trabalho cortado por outra pipa, eles saiam gritando e correndo sem nem mesmo olhar para os lados:
Avoou , avoou .... foi no cabresto.... que merda.
Imaginem a cena, era cômico ver aqueles senhores, no mínimo quarentões correndo só com uma bermudinha de nylon e boné para trás no meio de uns 20 moleques. Realmente, pareciam o Peter Pan e seus companheiros. Só que neste caso, apenas quem voava era a pipa. E não satisfeitos os mesmos compravam um sacolé e sentavam naqueles chãos de paralelepípedos e começavam a contar histórias da época da conchinchina, incrível como aqueles quarentões sempre tiveram um passado estupendo, maravilhoso.... Era uma situação realmente cômica e digna de um subúrbio que se preze, todo subúrbio tem que ter o seu arquétipo de tiozão soltador de pipa, na verdade os mesmo mais pareciam baleias Jubarte em época de acasalamento, mas são crias do subúrbio e têm o seu valor, até confesso que foram importantíssimos para o meu aprendizado de vida a observação de tais criaturas, pois ali aprendia tudo o que eu não queria ser, ou o que não era legal e com isso até me esforçava mais no colégio com medo de ser a próxima geração de tiozão. Ufa! Pelo menos dessa eu escapei....

Estava gostoso relembrar a minha doce infância, mas de repente o telefone toca e estraga todo o meu momento de descontração e nostalgia.

- Alô ,
- Alô , Thiago aqui é da Coca, tudo bem?
- tudo.
- Pois é, você pode dar uma olhadinha para mim nos dados de 2004, 2005 e 2006 de uma campanha em Porto Alegre?
- Claro, vou ver aqui e já te mando... abração.

Desliguei o telefone a pensei comigo mesmo:
- Puta que pariu e um dia ainda pensei em ter uma piscina cheia de Coca só para eu ficar mergulhando.


VIVA COSME E DAMIÃO!

segunda-feira, setembro 04, 2006

O Esperma Vencedor: Chorem mais e cobrem menos


Incrível como vivemos em um mundo de cobranças. Ainda no ventre de nossas mães temos que correr o mais rápido possível por essa longa estrada que nos dará a vida. E já nascemos com o fardo de sermos o esperma vencedor. Pronto... Bastou isso para começar toda uma trajetória de cobranças.
Mal nascemos e já tomamos uma porrada no meio da bunda. E se não chorarmos conforme os regulamentos, as porradas aumentam cada vez mais. Quem será que inventou estes malditos regulamentos?
Logo depois ainda rola uma incubadora e finalmente os colinhos de nossas mamães queridas. Mas e se a nossa primeira palavra não for mamãe? Será que terão mais cobranças? Será que ela não nos aceitará? E se não começarmos a falar na idade certa? Será que seremos mudos pra vida inteira?
...O dia amanhece bonito, o sol com uma cor alaranjada inacreditável. Tudo bem é o primeiro dia de aula, nervosismo a flor da pele, pois vamos para um lugar cheio de fulaninhos que nunca vimos antes e corremos o perigo de não nos enturmar ou simplesmente não irem com a nossa cara. O que eles estão achando de mim? Será que gostaram do meu corte de cabelo ou dos meus sapatos novos?
...Ihhh! semana que vem começam as provas novamente e mais umas vez somos cobrados a estudar pois caso isso não ocorra podemos nos tornar uns derrotados para o resto da vida. Mas eu odeio física, química e biologia será que serei realmente um derrotado se gostar mais de tocar guitarra ou jogar bola com os amigos? E olha que todos ainda dizem que jogo bem e que tenho um ouvido apurado, mas os nossos pais que são os que mais poderiam nos estimular em nossos talentos, são os que mais nos desestimulam. Não devemos recriminá-los, eles só querem o nosso bem. E além do mais, deve ser complicado mesmo para eles responderem aos amigos que seu filho está desempregado, mas toca guitarra bem pra caramba, quando estes perguntam o que nós fazemos. Há uma máxima que diz que quem não estuda não será ninguém na vida e não terá um emprego. Então não deve ser jogo mesmo continuar com a guitarra!
E aquela garotinha linda que senta na segunda fileira, ela nem deve saber que existo, é incrível como não há um santo dia na minha vida que não penso nela! Acho que terei que fazer um regime, pois dizem as más línguas que ela gosta de meninos magros e esbeltos e de preferência populares... Ihhh ferrou! Terei que inventar uma nova piadinha para as pessoas me acharem engraçado e quem sabe assim ser mais percebido ganhando a atenção daquele anjinho lindo em forma de gente.
Meu Deus! Que frio na barriga, domingo que vem tem o vestibular e o que acontecerá se eu não passar? Bom, se não passar pelo menos posso me tornar Gari, pois já tenho o segundo grau completo. Mas e se eu me tornar Gari e não conseguir limpar a rua inteira? A prefeitura vai me demitir?
Bom, não me tornei Gari, prestei uns dois anos de pré-vestibular e consegui passar para uma tão sonhada Universidade. Particular, admito, mas com os meus próprios méritos. Será que o analfabeto que também passou, passou com os próprios méritos?
Tá chegando a hora.... Acho que já vi essa cena antes... Será que vão raspar o meu cabelo?
Acho que não vou conseguir essa grana toda e não poderei ir à chopada. Que droga! Como a primeira impressão é a que fica posso ficar com o estereótipo do nerd, chato, mongol que não participou das primeiras chopadas, não obteve o ritual para a imersão neste novo mundo. Não fez a passagem, entende?
E isso pode desencadear nada mais, nada menos que passar os quatros anos dessa faculdade sem pegar ninguém ou o que é pior: formar virgem. Tenho uma graninha sobrando no banco, apesar da minha conta conjunta com meu pai estar sempre no cheque especial, mas o coroa vai entender que é realmente por uma boa causa, afinal já deve ter passado por isso. E cá entre nós, passar a faculdade inteira sem comer ninguém deve ser realmente o fim do mundo.
...Já são sete horas e a entrevista está marcada para daqui à 1 hora.Já confirmei tudo, cintinho combinando com sapatinho,cabelo bem penteado, até tirei os brincos que havia colocado em meados da minha adolescência quando ainda eram moda e as meninas só saiam com os rapazes que os usassem, exceto aquele do Romário da Copa de 94 que era uma argolinha com uma cruz pendurada, muito brega. Que bom que isso não acontece mais né!
...Como essas dinâmicas de grupo são chatas. E o mais incrível é que aqui todos sabem trabalhar em equipe mesmo sem nunca terem tido uma. Um fato interessante que observei é que nunca havia estado numa sala com grande incidência de pessoas com vontade de crescer. Aqui todos têm vontade de crescer e são comunicativos, até um carinha que quase não falou e deve ter por baixo uns 1,80 de altura. Como essa criatura ainda tem vontade de crescer? Como será que ele olha a vida lá de cima? Será que ele sente muito frio, pois com certeza ele está acima do nível do mar!
Pois é, o telefone tocou e eu não passei na dinâmica. Acho que vou trancar a faculdade, não dou para isso mesmo, nunca sou chamado para nada. “Sempre dizem a mesma coisa: “Queríamos alguém com mais experiência”, “Você não se encaixou no perfil da vaga”, Seu CV ficará guardado em nosso banco de dados para algum futuro processo.” Poxa, não agüento mais ouvir dizerem que não tenho experiência. Mas como terei uma porra de uma experiência se ninguém nunca me dá uma primeira chance de mostrar algo? Será que serei inexperiente para o resto da eternidade? Às vezes dá vontade de ser um cachorro, pois apesar de ser o melhor amigo do homem, vive rodeado de mulheres o paparicando 24 horas e a única coisa que ele precisa fazer é abanar um simples rabinho. Isso tudo além de comer de graça, dormir toda hora, não precisar trabalhar e fazer sexo com quem bem entender, até pernas humanas, pilastras e qualquer penduricalho rodam nesta história.
Onde estava com a cabeça quando resolvi fazer esta Faculdade? O único lado bom disso tudo é que pelo menos consegui arranjar uma namorada e mesmo assim ela anda reclamando nos últimos tempos que estou ficando desleixado. Reclama tanto que já estou até pensando em entrar para uma academia. Em tempos de vacas magras posso perdê-la se não o fizer, afinal as bombas tornaram-se os meus maiores concorrentes nos últimos anos.
...Hoje é o dia mais feliz da minha vida. Consegui o meu primeiro estágio... Mas e agora que já se passaram dois anos e nada de ser efetivado. Acho que prolongarei a faculdade, pois se formar sem estar encaminhado deve ser realmente um suicídio profissional...

Bom, apesar destas situações narradas acima serem ficções, muitas pessoas se identificaram e algumas até podem achar que foi escrito diretamente para elas. E já pararam para perceber que toda essa ladainha toda pode ser sintetizada com uma única palavra: Cobrança.
Tentem contar nos dedos, garanto que passarão alguns minutos, quem sabe até horas percebendo toda a cobrança implícita nos exemplos do dia a dia do jovem personagem acima. Imaginem se a vida realmente começasse aos 40. Fu......
O mais engraçado disso tudo é que desde a corrida aos nossos óvulos maternos estamos sempre sendo cobrados por tudo e por todos, principalmente pela mais massacrante instituição que já existiu na face da terra: a consciência.
E não satisfeitos temos que passar por todos os obstáculos que enfrentamos no decorrer da estrada, sorrindo como se nada estivesse acontecido ou acontecendo. Porque sorrir é sempre lindo, porque as pessoas que sorriem são simpáticas, bonitas e mais sociáveis. Por que realmente sorrir deve ser o sentimento mais puro e contagiante que alguém pode ter. E com isso, muitos renegam e colocam em menores patamares um dos mais nobres verbos da face da terra: chorar.
Aprendemos desde crianças que o choro é coisa de gente fraca, de mariquinhas e que chorando não conseguiremos nada, apenas fazer um showzinho nos fazendo de vítima.
E se todos chorassem mais ao invés de apenas sorrirem? Será que o mundo seria melhor e as pessoas mais felizes?
Não temos motivos para guardar tantas coisas dentro de nós quando o nosso organismo e principalmente nossas almas querem é justamente expulsá-las. Mas a sociedade faz o favor de retrair tudo, pois para isso o que nós chamamos de sociedade um belo sorriso é tudo que vale.As pessoas deveriam enxergar a beleza do chorar que é um gesto tão bonito quanto o sorrir.
As cobranças nunca acabaram e nunca acabarão. Poderíamos aprender a balancear melhor esta metralhadora de sorrisos falsos, alegres e gentis que fomos adestrados a fazer sempre, até mesmo quando não queremos. Pura forçação!
Se houvesse uma espécie de óculos raios-X da alma, as pessoas ao verem as outras sorrindo,acabariam chorando com elas e vice-versa.
Chorar é lindo sim. Enobrece o homem, lava o corpo e principalmente a alma. Nós não sabemos o quanto adoráveis somos independentemente de uma lágrima ou de uma gargalhada.
Estamos sempre tentando encontrar algo e nos forçando a acreditar que realmente precisamos deste algo, até mesmo daqueles que nunca foram encontrados. E isto acaba nos acarretando mais dependências e consequentemente mais sorrisos.Ou choros disfarçados de sorrisos?
Estamos sempre contando segredos, fazendo questões paralelas e criando ciências a parte, quando tudo que realmente precisamos fazer é parar de andar em círculos e tecer teias desnecessárias. E sim parar e chorar um pouco mais. Mas isto poderá ser uma vergonha para quem estiver nos assistindo, o que as pessoas pensarão da gente, né? Então acaba sendo mais cômodo voltar a nossa condição de esperma vencedor e sorridente, não acha?
Estamos sempre discutindo números, seguindo fórmulas e criando novos modelos de alguma coisa. E porque não voltar tudo como era antes?
A vida não é um plano, pelo contrário. Estes só servem para frustrar as pessoas. Não pensem que é mole! Ninguém nos dirá que é fácil demais, apenas aqueles que acham que é tranqüilo viver de olhos fechados compreendendo tudo o que vê. Mas realmente fica um pouco mais difícil se eles abrirem os olhos e compreenderem o que não se quer ver.
Ninguém fará nada por nós e pelos nossos maravilhosos sorrisos. Apenas nós mesmos.
Não precisamos viver em busca da tão sonhada e procurada fórmula do sucesso. Estas só aparecem em títulos de livro de auto-ajuda. Quando aparecem!
Tudo que precisamos fazer apenas é chorar um pouco mais e nos cobrar um pouco menos. Assim descobriremos plenamente algo que muitos por aí intitulam VIDA.


Thiago Valente Rolim de Macedo (04/09/06)
* Escrevi isto tudo aí chorando.